A bem da nação, eu também renuncio!
Neste momento de aflição em que todos temos de dar as mãos e deixar de olhar só para o nosso umbigo, correspondo ao apelo de quem nos governa e de quem apoia quem nos governa, faço pública parte da lista do que o Estado criou, e mantém para minha felicidade, e de que de estou disposto a patrioticamente prescindir.
Assim:
- Renuncio a boa parte dos institutos públicos criados com o propósito de me servir;
- Renuncio à maior parte das fundações públicas, privadas e àquelas que não se sabe se são públicas se privadas, mas generosamente alimentadas para meu proveito, com dinheiros públicos;
- Renuncio a ter um sector empresarial público com a dimensão própria de uma grande potência, dispensando-me dos benefícios sociais e económicos correspondentes;
- Renuncio ao bem que me faz ver o meu semelhante deslocar-se no máximo conforto de um automóvel de topo de gama pago com as minhas contribuições para o Orçamento do Estado, e nessa medida estou disposto a que se decrete que administradores das empresas públicas, directores e dirigentes dos mais variados níveis de administração, passem a utilizar os meios de transporte que o seu vencimento lhes permite adquirir;
- Renuncio à defesa dos direitos adquiridos e à satisfação que me dá constatar a felicidade daqueles que, trabalhando metade do tempo que eu trabalhei, garantiram há anos uma pensão correspondente a 5 vezes mais do que aquela que eu auferirei quando estiver a cair da tripeça;
- Renuncio ao PRACE e contento-me com uma Administração mais singela, compacta e por isso mais económica, começando por me resignar a que o governo seja composto por metade dos ministros e secretários de estado;
- Renuncio ao direito de saber o que propõem os partidos políticos nas campanhas pagas com milhões e milhões de euros que o Estado transfere para os partidos políticos, conformando-me com a falta de propaganda e satisfazendo-me com a frugalidade da mensagem política honesta, clara e simples;
- Renuncio ao financiamento público dos partidos políticos nos actuais níveis, ainda que isso tenha o custo do empobrecimento desta democracia, na mesma, na mesmíssima medida do corte nas transferências;
- Renuncio ao serviço público de televisão e aceito, contrariado, assistir às mesmas sessões de publicidade na RTP, agora nas mãos de um qualquer grupo privado;
- Renuncio a mais submarinos, a mais carros blindados, a mais missões dos nossos militares no estrangeiro, bem sabendo que assim se põe em perigo a solidez granítica da nossa independência nacional e o prestígio de Portugal no mundo;
- Renuncio ao sossego que me inspira a produtividade assegurada por mais de 230 deputados na Assembleia da República, estando disposto a sacrificar-me, apoiando - com tristeza - a redução para metade dos nossos representantes.
- Renuncio, com enorme relutância, a fazer o percurso Lisboa-Madrid em 3h e 30m, dispondo-me - mesmo que contrariado mas ciente do que sacrificio que faço pela Pátria - a fazer pelo ar, por metade do custo, o mesmo percurso em 1 h e picos, ainda que não em Alta Velocidade.
- Renuncio ao conforto de uma deslocação de 50 km desde minha casa até ao futuro aeroporto de Lisboa para apanhar o avião para Madrid em vez do TGV, apesar da contrariedade que significa ter de levantar voo e aterrar pertinho da minha casa.
- Renuncio a mais auto-estradas, conformando-me, com muito pena, com a reabilitação da rede nacional de estradas ao abandono e lastimando perder a hipótese de mudar de paisagem, escolhendo ir para o mesmo destino entre três vias rápidas, todas pagas com o meu dinheiro, para além de correr o triste risco de assistir à liquidação da Estradas de Portugal, EP.
Seria fastidioso alongar-me nas coisas que o Estado criou para o meu bem estar e que me disponho a não mais poder contar.
E lanço um desafio aos leitores: renunciem também!
Apoiemos todos, patrioticamente, o governo a ajudar o País nesta hora de aflição.
Portugal merece.
"Quando a gente pensa que sabe todas as respostas, vem a vida e muda todas as perguntas"
(gosto desta frase...)
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